Lucilia Guimarães Villa Lobos

Lucília Guimarães Villa-Lobos (1886-1966), nascida em Paraíba do Sul (RJ), foi pianista, regente, compositora e professora de música. Formada pelo Instituto Nacional de Música, ela se casou com Heitor Villa-Lobos em 1913, tornando-se uma figura crucial na interpretação e divulgação de suas obras iniciais. Lucília teve um papel pioneiro no ensino de música e canto em escolas públicas, dirigindo corais e ministrando cursos de canto orfeônico para professores. O coro Padre José Mauricio, dirigido por ela, foi premiado pelo Ministério da Cultura, e ela também organizou o coro do Santo Cristo e o conjunto Vozes do Brasil, contribuindo significativamente para a educação musical no Brasil. Além de pianista e professora, Lucília foi poetisa e compositora, com obras como “Hino ao Sol”, “Despertar”, “Bendita é a nossa terra” e “Meu Sertão”, enriquecendo o repertório de orfeões escolares.

A relação profissional e pessoal de Lucília com Heitor Villa-Lobos teve grande impacto na carreira do maestro. Consta que ela o ajudou a transcrever e a melhorar suas composições para piano, influenciando diretamente sua compreensão do instrumento. O casamento, no entanto, terminou de forma traumática em 1936, quando Villa-Lobos pediu o divórcio por carta durante uma viagem à Europa. Lucília nunca aceitou formalmente o divórcio e manteve o sobrenome do marido até sua morte. Após a separação, ela foi relegada ao ostracismo, mas continuou sua carreira como professora e regente de corais, contribuindo para a educação musical no Brasil até seus últimos dias. Sua contribuição para a música brasileira, especialmente na divulgação da obra inicial de Heitor Villa-Lobos, é reconhecida por estudiosos, apesar de frequentemente ofuscada pela figura do maestro.

A figura ímpar de Lucília Guimarães Villa-Lobos, uma profunda conhecedora de música, professora e incentivadora do canto coral. Viveu para a música e envelheceu sem perder o vigor artístico que a fazia transformar pessoas pouco experientes em vozes de grupos de canto orfeônico. A sua última criação foi o Orfeão Paraíba do Sul, em sua terra natal. Esse trabalho,, resultado dos esforços de toda uma comunidade com a Maestrina, se perpetuou em um disco LP, baseado em gravações de dois recitais do citado Orfeão Paraíba do Sul, sob a regência da Maestrina Lucília Guimarães Villa-Lobos:

Foi esta exímia pianista que, com sua dedicação e abnegação pessoais, catapultou Villa Lobos ao sucesso. Cifrando suas partituras, levando ao papel as músicas que o gênio tinha na cabeça ,dando-lhe forças para que ele alcançasse o retumbante sucesso. Durante uma viagem à Europa, em 1936, o músico Heitor Villa-­Lobos surpreendeu sua mulher com uma carta em que pedia o divórcio. Estavam casados havia 22 anos. Ele avisava que não voltaria ao lar, nem mesmo para pegar suas coisas ou ter uma conversa pessoal. Os motivos alegados eram vagos, mas um deles o maestro considerava infame: “Deixar pairar no espírito de muita gente mal informada do meu verdadeiro valor artístico, não só técnico como cultural e moral” a insinuação de que “tudo que sei e que sou devo a si unicamente”. A razão da separação era outra – chamava-se Arminda, sua secretária, loira e 25 anos mais jovem, com quem ele tinha um caso extraconjugal. Mas a carta expunha um incômodo real para um artista orgulhoso da própria obra como Villa-Lobos. Sua primeira companheira, Lucília Guimarães Villa-Lobos, era uma pianista virtuosa, formada no Instituto Nacional de Música, aluna de um discípulo de Chopin e profunda conhecedora do instrumento. Quando se casaram, em 1913, Villa-Lobos mal tocava piano – seus instrumentos eram o violão e violoncelo. Ele nunca viria a ter uma formação musical clássica. Apesar disso, além de música de orquestra, é autor de uma centena de composições para piano, obra que pela inventividade é considerada uma das mais importantes do século XX – logo nos primeiros trabalhos exibe, segundo os críticos, um profundo conhecimento das minúcias e dos segredos do instrumento. Nessas circunstâncias, os detratores de Villa-Lobos não tardaram a sugerir que o mérito dessa genialidade devia-se à mulher. O irmão da pianista, Luiz Guimarães, escreveu que os primeiros trabalhos para piano solo de Villa-Lobos eram criações conjuntas com Lucília. E que duas obras dessa época foram de “inteira autoria” dela. Ele não diz quais são. Era uma visão contaminada pelo rancor em relação ao destino da irmã. No entanto, a musicista Lisa Peppercorn, amiga do maestro, escreveu que Villa-Lobos tinha dificuldades em transcrever suas ideias para os instrumentos e Lucília o ajudava, tocando piano. Biógrafos e estudiosos concordam que a primeira mulher foi muito importante na obra de Villa-Lobos. O musicólogo Manoel Corrêa do Lago diz que Villa-Lobos não conhecia bem o piano antes de se casar com Lucília, e seu domínio aumentou radicalmente entre 1912 e 1918. De acordo com ele, o fato de ter em casa um piano e uma grande intérprete que entendia seu projeto musical permitiu a ele testar mais o instrumento em sua companhia. “Lucília é um personagem que precisa ser valorizado, mas não pelos motivos maledicentes. Jamais interferiu na escrita musical de Villa-­Lobos, mas teve influência enorme em sua compreensão do piano”, diz Lago. Lucília foi a primeira intérprete de dezenas de composições do maestro. Esteve ao lado dele no projeto do Canto Orfeônico, de educação musical nas escolas, embora seu nome seja pouco lembrado por esse trabalho. E viveu uma tragédia afetiva. “Ela dizia que trabalhava muito fora, um dia teve de voltar para casa por algum motivo e flagrou Villa-Lobos e a secretária na cama dela. Ficou arrasada, porque não queria se separar”, diz Zélia Barros Pinto, de 78 anos, que morou com ela em Paraíba do Sul. Deixou uma centena de composições, a maioria para canto coral, embora sem a genialidade de Villa-Lobos. Por essa produção mereceria ter seu nome na história da música brasileira. Acabou, no entanto, ofuscada pelo ex-­marido, de cuja sombra nunca conseguiu se distinguir.

Lucília Guimarães Villa-Lobos faleceu em maio de 1966, no Rio de Janeiro, no auge do seu trabalho com o Orfeão Paraíba do Sul.