Manuel Joaquim do Amaral Gurgel

Manuel Joaquim do Amaral Gurgel. — Paulista, nascido nesta capital, a 8 de setembro de 1797. Era alto, bem apessoado, moreno pallido, fronte larga e intelligente, physionomia grave mas bondosa, infundindo respeito e sympathia. Com os annos desenvolveu-se a corpulência e formou-se-lhe um como que duplo queixo. Por ser de vultosa estatura, chamavam-no Cayaná. Talento primoroso e já bastante cultivado na sua quadra académica, era Manuel Joaquim o primeiro estudante do anno, estimado, querido e admirado por mestres e coUegas. Assim, á medida que o segundo premio, instituido pelos estatutos do Curso Juridico, era sempre disputado com ardor por muitos dos seus collegas, e, por vezes, como temos visto, proposto, em egualdade de condições, a mais de um, pelo lente da cadeira, o primeiro cabia, geralmente, sem competência, a Manuel Joaquim. Dissemos que, quando se matriculou no Curso Juridico, já trazia elle grande preparo intellectual. E essa.é a verdade. Tinha já ordens de presbytero e contava para mais de seis lustros de edade. Depois de um bom curso de latinidade, na aula régia do professor André da Silva Gomes, tendo como coUegas Vicente Pires da Motta, João Chrispiniano, Joaquim Ignacio Ramalho, Ildafonso Xavier Ferreira, Raphael Tobias, Manuel José Chaves, Francisco de Azevedo Júnior, João Carlos Telles, Martim Gomide e outros, matriculou- se no curso de theologia que acabava de installar-se no convento do Carmo, sob a direcção de frei António do Bom Despacho Mamede. Mais tarde, em 1814, tendo-se inaugurado no convento de S. Francisco uma, aula de philosophia na qual doutrinava o Bossuet brazileiro, eminente frade franciscano e grande orador sagrado. MonfAlverne, inscreveu-se Manuel Joaquim entre os seus disci^Dulos e tornou-se delles o mais notável. Pouco depois, tendo-se instruído noutras disciplinas, foi nomeado pelo bispo D. Matheus para reger a cadeira de Historia Ecclesiastica, recem- creada no Seminário de S. Paulo. Em 1816, recebeu ordens de presbytero e começou, desde então, a fulgurar entre os mais fulgidos ornamentos do clero paulistano. Em 1823, pouco após á queda do ministério Andrada e á dissolução da Assembléa ConstiTRADIÇÕES E REMINISCÊNCIAS 101 tuinte, O padre Manuel Joaquim, que já então começava a apparecer na politica liberal de S. Paulo, foi deportado para o Eio de Janeiro, de concomitância com outros correligionários seus, por ordem de D. Pedro I (*). O seu nome, de então por deante, não deixou mais de figurar nos principaes acontecimentos da chronica politica paulistana. No mesmo anno de 1828, em que se matriculou no Curso Jurídico, que então se inaugurava, viu-se eleito membro do conselho geral da provinda e do conselho do governo. Com a decretação do acto addicional foi deputado provincial consecutivamente de 183-i e 1842 e no biennio de 184:7-18. No quatriennio de 1834-37, tomou assento, como supplente, na Gamara dos Deputados, e estava eleito deputado eíFectivo á legislatura de 1842, previamente dissolvida. Dahi por deante, comquanto o vejamos mais de uma vez no exercício do governo desta província, como seu primeiro vice-presidente, é certo, não obstante, que muito esmoreceu a sua actividade politica. A explicação desse facto, dado o nunca desmentido patriotismo de Manuel Joaquim, nós a encontramos na sua discreta attitude por occasião do movimento sedicioso de 18-42. Divergente da opinião do chefe, que era o biígadeiro E-aphael Tobias, e de outras summidades do partido liberal, taes como Feijó, Vergueiro e Rodrigues dos Santos, foi elle contrario áquella revolta, e, juntamente com Manuel Dias e o coronel Joaquim Floríano de Toledo, absteve- se de encampar com a sua responsabilidade politica aquelle movimento armado, consíderando- o como infenso aos verdadeiros interesses da idéa liberal.

A Academia de Sao Paulo - Tradicoes e Reminiscencias